terça-feira, 3 de outubro de 2023

Considerada extinta, flor do grupo dos lírios é 'redescoberta' após mais de cem anos

 

Por Giovanna Adelle, Terra da Gente


Sem nome popular, considerada uma desconhecida. Habitante da Mata Atlântica, a flor Griffinia ornata havia sido dada como extinta pela ciência, mas reapareceu certo dia na Serra do Mar, em Ubatuba (SP), para um botânico que caminhava pela mata.

"É uma planta desconhecida para a ciência. Algumas plantas da família dela são conhecidas como açucenas, mas seria o nome de outras plantas do gênero Griffinia. Não dessa", conta José Ataliba Gomes, consultor ambiental e pesquisador do Departamento de Botânica da Unicamp.

A foto da redescoberta foi tirada em 2017, por Ataliba, quando foi possível confirmar a identidade da Griffinia ornata. No entanto, o estudo completo ainda está sendo finalizado pelo pesquisador responsável, o doutorando em Biologia Vegetal, Antonio Campos Neto.

De acordo com pesquisas feitas por ele e por sua orientadora, doutora Julie Dutilh, a planta tinha sido registrada pela última vez em 1878, há 139 anos atrás! Devido a falta de novos registros, a espécie foi considerada por especialistas como extinta.

De acordo os pesquisadores, Griffinia é um gênero de plantas endêmico do Brasil - ou seja, que só existe aqui -, pertencente à família Amaryllidaceae, representado por aproximadamente vinte espécies, muitas das quais ameaçadas ou em vias de extinção.

Durante anos, Ataliba integrou o projeto Biota Gradiente Funcional, cuja função era fazer o levantamento da vegetação ao longo do perfil da Serra do Mar, levando em conta cada grau de altitude. Em uma dessas andanças, o botânico deu de cara com a flor.

"Aí eu olhei e falei poxa tá diferente espécie de Griffinia que ocorre aqui em Ubatuba. Fotografei e aí já mandei para o Antônio, que é o especialista. 'Qual é o nome dessa daqui? Registro novo', brinquei com ele. Aí ele falou, 'Ataliba onde que você pegou isso, eu não sei o que é'", relembra José.

Feitos os registros, ele retornou 15 dias depois com Antonio e outro aluno da universidade. Juntos, eles coletaram amostras do material para análise e confirmação da identidade da espécie.

 

'Griffinia ornata', planta endêmica do Brasil e pertencente ao grupo dos lírios — Foto: José Ataliba Gomes

Últimos registros

 Os estudos apontam que, nos século 18 e 19, vários coletores enviavam plantas vivas principalmente para a Inglaterra, onde havia muito interesse no cultivo de espécies ornamentais. Exemplares da América do Sul atraíam a atenção dos estrangeiros pela exuberância e beleza das plantas e flores.

"Ela foi descrita em 1876, de plantas que estavam em cultivo em Londres e haviam sido enviadas do Rio de Janeiro. Depois, uma nova descrição foi apresentada em 1878, também com base nas mesmas plantas em cultivo na Inglaterra. Desde então, nunca mais foi", comenta Antonio.

  • Em 1820: John Bellenden Ker Gawler publicou Griffinia hyacinthina na revista científica Botanical Register;
  • Em 1836: John Lindley publicou Griffinia intermedia no Botanical Register, com prancha colorida;
  • Em 1876: Thomas Moore publicou G. ornata no Gardeners' Chronicle com desenhos, a partir de material enviado do Rio de Janeiro e em cultivo em Londres;
  • Em 1878: John Gilbert Baker publicou descrição, com uma prancha colorida, do que ele considerava Griffinia ornata, mas era Griffinia hyacinthina.

 


Foto de registro da Griffinia ornata feito em 1876, no periódico The Gardeners Chronicle. — Foto: Julie Dutilh





Características

Com um padrão de cor diferente e azulado, flores grandes e numerosas, a Griffinia ornata fascinou os pesquisadores. Para eles, a dificuldade de registro vem da raridade quase absoluta da espécie, que é muito sensível a interferências no ambiente.

Por muito tempo, a flor foi considerada sinônimo da Griffinia intermedia e da Griffinia hyacinthina. A descoberta de Ataliba veio para auxiliar no processo de estudo da espécie cujos resultados apontaram diferenças filogenéticas e morfológicas em relação às outras.

"As sementes têm um apêndice com substâncias que interessam às formigas. Então, elas retiram esse apêndice, carregam para o ninho ou pelo menos em direção ao ninho e dessa maneira elas espalham. Se você tem uma área com muito veneno contra formigas, você pode não ter mais as que são necessárias para espalhar essa espécie", explica Julie.





Outros pontos importantes de sua ecologia, com impactos no tamanho das populações, são o tempo de frutificação e as condições ambientais necessárias. Segundo os pesquisadores, a Griffinia ornata floresce entre os meses de outubro a dezembro, com a frutificação a partir do mês de novembro.


A maturação dos frutos pode levar mais de seis meses e o habitat da planta é a Floresta Ombrófila Densa, nas proximidades da divisa entre os estados do Rio de Janeiro e São Paulo. Em uma região muito afetada pelo avanço imobiliário, inclusa no cenário de mudanças climáticas, é difícil entender como algumas espécies ainda sobreviveram.

"A ecologia dela é complexa, ela demora para crescer, demora para formar fruto. As populações são pequenas, por isso, ela é muito sensível à interferências. [...] A gente está aumentando as informações sobre ela e se alguém, depois, for fazer um projeto de conservação, já fica mais fácil", diz a doutora


FONTE   :  https://g1.globo.com/sp/campinas-regiao/terra-da-gente/noticia/2023/10/02/considerada-extinta-flor-do-grupo-dos-lirios-e-redescoberta-apos-mais-de-cem-anos.ghtml





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