A vegetação da Mata Atlântica em Ubatuba (SP) guarda preciosidades que surpreendem especialistas. Uma planta rara chamada Griffinia ornata foi encontrada no município por acaso em 2017 pelo biólogo especialista em botânica e vice-presidente do Instituto da Árvore, José Ataliba Mantelli Aboin Gomes. Desde 1876, não era conhecido nenhum registro da espécie em habitat natural. A descoberta resultou em uma importante pesquisa acadêmica sobre a planta, realizada pelo biólogo especialista em biologia vegetal Antonio Campos-Rocha. E neste ano, por sua relevância e destaque, a Griffinia ornata foi escolhida como a planta-símbolo da II Jornada Rio-São Paulo de Botânica, que aconteceu em junho na capital paulista.
A descoberta
Tudo começou quando o fotógrafo Tiago Lima Marcelino foi convidado para participar da produção de dois livros, um sobre o Pantanal (@olhosdopantanal) e outro sobre a Mata Atlântica (@olhosdamataatlantica), em um projeto aprovado pela Lei Rouanet e executado com recursos da empresa FMC Agrícola.
Como a Mata Atlântica é um bioma muito diverso, com diferentes fisionomias, o fotógrafo optou por realizar o trabalho acompanhado por um biólogo. Foi quando conheceu Ataliba. Então, durante a expedição fotográfica por Ubatuba, Ataliba visualizou a Griffinia ornata e ficou maravilhado. Naquele momento, ele ainda não tinha certeza, mas desconfiava estar diante de uma planta raríssima, que não era vista na natureza há mais de cem anos. Tiago captou imagens da exuberante planta, que estava florida, e Ataliba coletou amostras para tentar posteriormente identificar a espécie, com ajuda de colegas especialistas.
“Na época eu mandei imagens para meu amigo biólogo, Antonio Campos-Rocha, e ele mostrou o material para a professora Julie Dutilh, que começou a fazer o resgate de informações sobre a planta”, conta Ataliba.
A planta
De acordo com o biólogo Antonio Campos-Rocha, Griffinia é um gênero botânico endêmico do Brasil pertencente à família Amaryllidaceae e está distribuído por todo o país, com exceção da região sul. No Estado de São Paulo, os registros são todos em regiões próximas ao Rio de Janeiro. São plantas da família do alho e da cebola, possuem uma estrutura subterrânea e, em geral, são plantas de sub-bosque, ou seja, gostam de áreas sombreadas de mata e floresta. A maior diversidade de espécies de Griffinia está nos estados do Espírito Santo e da Bahia.
Ainda segundo o biólogo Antonio Campos-Rocha, a espécie Griffinia ornata foi descrita em 1876 a partir de plantas em cultivo na Inglaterra, importadas do Rio de Janeiro no ano anterior. Esse teria sido o último registro conhecido dessa espécie em habitat natural. Porém, a partir de pesquisa sobre a identidade e distribuição da planta, o biólogo descobriu que havia um segundo registro, feito em 1906 no município de Caraguatatuba (SP). E depois da divulgação da descoberta de Ataliba em 2017, em Ubatuba (SP), outras quatro subpopulações adicionais já foram localizadas no município. A descoberta desses quatro novos registros será divulgada em breve na Oryx, uma prestigiada publicação internacional de conservação.
“O padrão de nervura das folhas dela é muito bonito, é uma planta grande, que dá até 24 flores nas cores lilás e branca, apenas ela tem um número tão alto de flores entre as espécies do gênero Griffinia”, relata Antonio.
Planos para o futuro
Como a Griffinia ornata é uma espécie muito sensível à interferência humana no ambiente, sua conservação é um desafio que exigirá estudos mais aprofundados e ações específicas.
“Temos cinco registros em Ubatuba, mas estão em áreas bem vulneráveis, fora dos limites do Parque Estadual Serra do Mar, o que nos deixa preocupados. As populações são pequenas. Aquela primeira população localizada pelo Ataliba sofreu ataques por uma lagarta invasora exótica que devora as folhas e a estrutura subterrânea, e acaba matando a planta”, explica Antonio.
“Embora a maioria das espécies de Griffinia esteja oficialmente listada como ameaçada de extinção no Brasil, a Griffinia ornata nunca foi incluída em nenhuma das listas vermelhas brasileiras, nem recebeu qualquer proteção legal no país. Por isso, sugerimos que medidas urgentes sejam tomadas para garantir a preservação de suas populações, com a participação ativa da sociedade civil e das autoridades públicas”, defende o pesquisador.
“É uma planta espetacular, bem ameaçada. Estamos tentando montar um programa de reprodução dela junto com alguns jardins botânicos que eu trabalho, fazer uma pesquisa séria de reintrodução. Eu faço parte da Rede Brasileira de Jardins Botânicos e combinei com alguns curadores de coleção de fazer uma nova visita em novembro, que é a época que essa planta vai estar florida. Estamos bolando alguns planos de conservação e reprodução dela”, conta Ataliba.
Por Renata Takahashi / Tamoios News
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